O Bem Diferencial e o Mal Diferencial

Pensei muito antes de tecer comentários sobre o massacre ocorrido em uma escola do Rio de Janeiro, onde um jovem , ex-aluno do colégio, ele entrou armado e ceifou a vida de 11 (onze) crianças, e deixando outras mais em estado grave. Fiquei impotente e chocada com tal acontecido. Fiquei tão indignada que questionei Deus. Como o Senhor pôde ter perdido tanto tempo em criar tão perversos e cruéis como os seres humanos?. Passei horas trocando ideias com Ele na esperança de uma resposta que satisfizesse o meu questionamento. Então mergulhei na minha experiência de intimidade com Deus, que é tão forte, para que Ele me desse uma razão para ainda acreditar que a humanidade tem jeito e ainda vale a pena lutar por ela. E eu recebi não só a resposta como a explicação para meus questionamentos, e de quebra Ele me inspirou a escrever sobre o acontecido mostrando-me um outro lado que ainda não havia visto.

Deus deu ao homem a racionalidade que o tornar consciente/pensante das suas ações, bem como superior aos demais animais existentes no planeta. Isso nos possibilita inferirmos na natureza e ela em nós, é assim que funciona a condição humana uma eterna reciprocidade entre o homem e o mundo e nesta convivência nos tornamos humanos. Uma vez li uma frase de Fernando Pessoa que dizia assim: “O que significa ser humano? ...”um cadáver adiado...” . Talvez está frase devesse ser inscrita na lapide do assassinado.

O grande problema quando acontece algo de absurdo, como o caso citado acima, costumamos atribuir a ação do feitor as mais diversas patologias e rituais de seitas, retirando aquilo que é próprio dele, a responsabilidade pelas suas ações, logo retiramos dele sua condição de ser humano.

Uma vez houve uma fato onde uma criança levou para escola a arma de seu pai para exibir aos seus colegas. Isso teve uma repercussão enorme. Lembro-me que convidaram o filósofo brasileiro Mário Sérgio Cortella, para comentar o caso. Mário Sérgio é uma sumidade aqui em nosso país, sou admiradora do trabalhado dele pela sua coerência e pela sua vasta experiência na educação.

Ele começa comentando o caso dizendo que os jovens estão grávidos deles mesmos (como ele costuma dizer) e que este jovem vai dar à luz a uma nova pessoa a qualquer momento, e por causa de seus distúrbios hormonais, ele tem dificuldade de humor, tem incapacidade às vezes de entender o que está acontecendo e por isso o adolescente, precisa diferenciar-se e destacar-se, e ele sinaliza isso com algo que lhe dá poder, isso é o que Mário Sérgio chama de Bem Diferencial(tatuagem, pircing, etc). Neste acontecimento noticiado, nada de grave aconteceu o menino apenas pegou a arma para mostrar aos colegas, e segundo Mário Sérgio esta é uma forma dele dizer: “Eu tenho e você não”. Quando os pais souberam, pelo próprio filho, procuraram a direção da escola. Lá relataram o acontecido e disseram estar ciente do erro que cometeram em deixar a arma ao alcance de seu filho e procuraram a escola para compartilhar  o ocorrido, para evitar que algo parecido ou pior acontecesse no futuro.

Bom, pelo menos esta história teve um final feliz, o mesmo não aconteceu com o caso do Rio de Janeiro. Mas, vou me apropriar um pouco das sabias palavras de Mário Sérgio para comentar este caso.

Concordo com Mário Sérgio quando ele diz que os jovens estão grávidos deles mesmos, só que vou estender isso não só aos jovens mais a toda fase da vida humana de modo geral, pois estamos o tempo todo em embate com o nosso lado luz e o nosso lado sombra. A todo momento estamos gestando uma nova pessoa dentro de nós e depois damos à luz a ela. Deus nos privilegia o tempo todo, foi assim com a racionalidade que além de nos diferenciar dos outros animais terrestres, nos deu superioridade sobre eles. Enviou Jesus Cristo, o verdadeiro Ser Humano, para nos ensinar a usar a racionalidade com autonomia e sabedoria,  nos ensinou a usar a consciência para poder aprender a domar e a domesticar o animal perverso e cruel que existe dentro de todos nós, a interagirmos com a natureza, mostrando que neste movimento aos poucos vamos caminhando para a feitura do Ser Humano verdadeiro.

Se soubermos dominar e domesticar as nossas feras, os outros ensinamentos vão nos impulsionando e aí daremos à luz a uma nova pessoa, melhor a cada dia, daremos à luz ao Bem Diferencial.

Foi isso que não aconteceu com o assassino que invadiu a escola no Rio de Janeiro e vitimou crianças indefesas. Existem duas feras dentro de nós: uma lhe tornará um ser de Bem Diferencial e a outra lhe tornará um ser de Mal Diferencial. Qual deles será o pior para você? Aquele que você não domar e não domesticar, pois será alimentado pela crueldade e perversidade do instinto animal que que possuímos ainda dentro de nós, e quando vier à luz essa nova pessoa ela terá em si o Mal Diferencial que comprometerá a sua condição de SER HUMANO.

Confesso que quando assistir ao noticiário fiquei chocada, e pensei que Deus perdeu tempo quando decidiu criar a raça Humana. Os dias que sucederam ao acontecido essa ideia não me saiu da cabeça. Então resolvi perguntar a Deus o que aconteceu de errado com sua criação.

E no meu silêncio, no meu mais profundo eu, escutei vindo em forma de brisa leve uma voz que dizia assim: “Eu nunca perco tempo nas minhas criações...” , logo em seguida me veio a mente o policial que entrou na escola sozinho, sem saber ao certo o que estava acontecendo e quantos eram os meliantes, deu de cara com o assassino e o deteve. … O Bem Diferenciado, um Ser Humano que fez o seu dever de casa, domou e domesticou o ser mais inferior que existia dentro dele, e gestou em si uma nova pessoa e naquele momento deu à luz a ela, fez a diferença, arriscou sua vida para salvar aqueles que ainda poderiam ser salvos e evitou um mal maior: a morte de todos.

Nada justifica ocorrido, nada justifica a morte daquelas crianças , nada vai apagar a dor de seus pais, de seus colegas, professores e vizinhos. O trauma vai ficar. Não podemos mudar o que aconteceu, mas podemos aprender com o que aconteceu. O momento agora é encontrar um jeito de lidar com a dor que fica e continuarmos a viver. E para isso vou me valer das palavra de uma outra pessoa que eu também admiro muito, pe. Fábio de Melo, no seu livro Quando o sofrimento bater à sua porta: “ A partir do momento em que eu me recuso a viver o sofrimento, as pessoas ao meu lado sofrem. Vamos organizar nosso luto e nossa tragédia, mas continuar vivendo. Vamos descobrir os motivos que nos ajudam a viver a vida. Muitas vezes, a incapacidade de organizar o sofrimento nos desestrutura. … Não podemos mudar o sofrimento, mas podemos pedir o milagre da saber conviver com ele. Ainda estou convencido de que o pior dos sofrimentos, nesta vida, é o sofrimento de não saber sofrer... Se você está sofrendo muito, permita que Jesus cuide de você.”

Para nós que fomos meros espectadores, fica a reflexão daquilo que poderia ter acontecido com qualquer um de nós. Aos que infelizmente não tiveram a sorte de serem salvos, fica a certeza de terem sido acolhidos por Jesus Cristo e é para eles que deveremos dedicar as nossas preces, bem como para o assassino. Pode ser estranho eu estar fazendo este pedido, mas de todos quem mais está sofrendo neste momento é ele, e como criatura de Deus devemos ser  como Ele. misericordioso tal qual o nosso Pai o É.

Muita paz para as famílias, amigos, professores e todos que participaram direta ou indiretamente da tragédia. Que Deus conceda o bálsamo que aliviará as suas dores.

"Ninguém ama sem morrer um pouco, mas ninguém é amado sem ressuscitar também. Por isso precisamos dos dois movimentos do amor. Na morte,o empenho que nos prepara como humanos. Na ressurreição,a delícia de já poder sentir na carne o surpreendente sabor daquilo que já é eterno.

Pe. Fábio de Melo

"O maior milagre operado é quando Deus muda nosso jeito de pensar; o milagre  da palavra transformadora. Não adianta estar curado no corpo, se não estamos curados na alma para interpretar a vida que vem depois. Estamos, o tempo todo, pedindo para que Deus tire nosso sofrimento, mas, hoje, tenha a coragem de pedir para que o Senhor nos ajude a ver diferente o nosso sofrimento. Deus nos toca naquilo que nos modifica, não podemos tirar o sofrimento do nosso coração, mas o Pai vai nos fazer interpretar a vida de um jeito novo e saber que, esse sofrimento, não é o fim, mas o inicio de uma nova vida”. (pe. Fábio de Melo)

"P A Z"

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